Jogo de Palavras

"No principio era o logos..."

domingo, julho 02, 2006

"Eu te ordeno levanta-te"



A passagem do Evangelho deste domingo está cheia de cenas que se sucedem rapidamente em lugares diferentes. Está, antes de tudo, a cena nas margens do lago. Jesus está rodeado de uma grande multidão quando um homem se joga aos seus pés e lhe dirige uma súplica: «A minha filha está a morrer; vem, impõe tuas mãos sobre ela, para que se salve e viva». Jesus põe-se então a caminho com o homem até a sua casa. A segunda cena acontece no caminho. Uma mulher que sofria de hemorragias aproxima-se de Jesus às escondidas para tocar no seu manto, e sente-se curada. Enquanto Jesus falava com ela, da casa de Jairo chegam a dizer-lhe: «Tua filha morreu. Para que incomodar o Mestre?». Jesus, que ouviu tudo, diz ao chefe da sinagoga: «Não temas, mas tem fé». E eis aqui a cena crucial, na casa de Jairo: grande confusão, gente que chora e grita, como é compreensível ante o falecimento recém ocorrido de uma adolescente. «Entra e diz-lhes: “Por que vos desesperais e chorais? A menina não morreu; está dormindo”. [...] Ele, depois de mandar todos para fora, toma consigo o pai da menina, sua mãe e os seus, e entra onde estava a menina. E tomando a mão da menina, lhe diz: “Talita kum”, que quer dizer: “Menina, levanta-te”. A menina levantou-se e pôs-se a andar, tinha doze anos. [...]. E insistiu muito para que ninguém o soubesse; e disse-lhes que lhe dessem de comer».
A passagem do Evangelho sugere uma observação. Volta-se a discutir continuamente sobre o grau de historicidade e fiabildiade dos Evangelhos. Assistimos recentemente ao intento de pôr no mesmo nível, como se tivessem a mesma autoridade, os quatro evangelhos canônicos e os evangelhos apócrifos dos séculos II-III. Mas esta tentativa é simplesmente absurda e demonstra também boa dose de má fé. Os evangelhos apócrifos, sobretudo os de origem gnóstica, foram escritos várias gerações depois por pessoas que haviam perdido todo contato com os fatos e que, além disso, não se preocupavam nem minimamente por fazer história, mas só por colocar nos lábios de Cristo os ensinamentos próprios da escola delas. Os evangelhos canônicos, ao contrário, foram escritos por testemunhas oculares dos fatos ou por pessoas que haviam estado em contato com as testemunhas oculares. Marcos, de quem lemos este ano o Evangelho, esteve em estreita relação com o Apóstolo Pedro, de quem refere muitos episódios que o tiveram como protagonista. A passagem deste domingo nos oferece um exemplo desse caráter histórico dos Evangelhos. O nítido retrato de Jairo e seu pedido angustiado de ajuda, o episódio da mulher que encontra a caminho de sua casa, a atitude céptica dos mensageiros para com Jesus, a tenacidade de Cristo, o clima das pessoas que choram pela menina morta, o mandato de Jesus referido na língua original aramaica, a comovedora solicitude de Jesus de que se dê algo de comer à menina ressuscitada. Tudo faz pensar em um relato que remete a uma testemunha ocular do facto.
Agora, uma breve aplicação do Evangelho do domingo à vida. Não existe só a morte do corpo, também está a morte do coração. A morte do coração existe quando se vive na angústia, no desânimo ou em uma tristeza crônica. As palavras de Jesus: Talitá kum, menina, levanta-te! Não se dirigem portanto só a rapazes e moças mortos, mas também a crianças que vivem. Que triste é ver os jovens... tristes. E há muitíssimos ao nosso redor. A tristeza, o pessimismo, o desejo de não viver, são sempre coisas más, mas quando se vêem ou se ouvem jovens expressar isso, o fato oprime o coração ainda mais. Neste sentido, Jesus continua ressuscitando também hoje a meninas e meninos mortos. Ele o faz com sua palavra e também enviando-lhes seus discípulos, que, em Seu nome e com Seu mesmo amor, repetem aos jovens de hoje aquele grito Seu: Talitá kum: menina, levanta-te! Volta a viver.
(pelo pregador do Papa)

1 Comments:

  • At quarta-feira, julho 05, 2006 12:08:00 da tarde, Blogger Aida Melo said…

    Olá Nahar! Gosto das tuas reflexões da Palavra. Esta parece que a encontraste algures em Roma, não importa tanto donde veio mas o que se diz. Como já deves ter reparado no meu blog tanto eu como Pedro estamos fascinados por esta palavra: LEVANTA-TE!
    É daquelas experiências do Espírito que não são fáceis de descrever mas que marcam de tal forma, que mudam para sempre uma vida. É o que está a acontecer connosco. Embora os nomes que usamos sejam virtuais a experiência é muito real e nós também o somos.
    Entre outras referências chamou-me a atenção a actualização que se faz do Talitá kum:
    "Jesus continua ressuscitando também hoje a meninas e meninos mortos. Ele o faz com sua palavra e também enviando-lhes seus discípulos, que, em Seu nome e com Seu mesmo amor, repetem aos jovens de hoje aquele grito Seu: Talitá kum: menina, levanta-te! Volta a viver."
    Pode até parecer presunção mas temos percebido no apelo de Deus que depois da experiência de Êxodo e de conversão que vivemos Ele nos envia a contar a todos como nos ressucitou a partir desta palavra: Levanta-te! Vai!
    É para isso que tem servido o blog, talvez surjam outros meios. Vamos ao ritmo que Ele vai proporcionando, não sem enfrentar violentas tempestades... mas já sabíamos que seria assim, porque o discípulo não é superior ao Mestre!
    Reza por nós!

    Continuação de bons exames, estou no mesmo desafio :-)

     

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